Cérebro e entropia

Cerebro e Entropia

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Existem assuntos interessantes sobre como o cérebro se comporta, um dos assuntos que li: a maioria da atividade do cérebro acontece quando estamos em repouso. Em outras palavras, é quando estamos tranquilos. Sabe aquele momento em que você só está olhando para o teto, andando sem destino, ou apenas deixando os pensamentos vagarem? Pois é. É aí que o cérebro está mais ocupado — ou melhor, mais espontâneo. E isso não é papo de meditação ou esoterismo, é ciência mesmo.

O estudo do cérebro em estado de repouso tem ganhado cada vez mais espaço na neurociência. Uma das ideias mais interessantes que surgiram é a de que o cérebro, mesmo sem tarefa nenhuma, fica produzindo padrões e flutuações complexas. Essas flutuações, que antes pareciam ruído, começaram a ser vistas como um tipo de reserva funcional, um preparo silencioso para quando a gente realmente precisa usar nossas habilidades cognitivas.

E é aí que entra um conceito que parece saído direto de um curso de física, mas que está revolucionando o modo como entendemos o funcionamento cerebral: a entropia.

Entropia, nesse contexto, é uma medida de imprevisibilidade, de aleatoriedade. Quando falamos em entropia do cérebro, ou "brain entropy", estamos tentando entender o quão organizadas — ou desorganizadas — estão as flutuações da atividade cerebral em repouso. Um cérebro muito caótico pode ter dificuldade de manter funções básicas. Um cérebro rígido demais, com pouca variação, pode ser pouco adaptável. Então a entropia seria como uma régua para medir esse equilíbrio sutil entre ordem e desordem. Parece complexo de entender, mas não é.

Essa medida, que parece tão técnica, tem relação direta com nossa inteligência, com os anos de estudo que acumulamos e até com o desempenho em tarefas cognitivas. Quando alguém diz que estudar "expande a mente", talvez esteja falando, sem saber, de uma redução na entropia cerebral em regiões estratégicas do cérebro.

Pesquisadores conseguiram medir essa entropia usando exames de ressonância magnética funcional em repouso. Ao invés de observar o cérebro durante tarefas específicas, eles capturaram os momentos em que os voluntários estavam apenas descansando, sem estímulos externos. E o que viram foi revelador: mesmo sem fazer nada, o cérebro mantém uma atividade riquíssima, cheia de flutuações que carregam informações sobre nossa cognição e até nosso histórico de aprendizado.

A entropia foi medida principalmente em duas redes cerebrais: a rede do modo padrão (a famosa DMN, aquela que fica ativa quando estamos pensando em nós mesmos, no futuro, em situações sociais) e a rede de controle executivo (ECN, mais voltada para o planejamento, atenção e tomada de decisão). Essas duas áreas são tipos os bastiões da cognição de alto nível. E a entropia nelas não é aleatória: quanto menor a entropia nessas redes, melhor a pessoa se sai em testes de inteligência fluida, que avaliam a capacidade de resolver problemas novos.

Olha que interessante: menos entropia, mais inteligência. É como se o cérebro, ao manter essas regiões mais coesas e menos caóticas em repouso, ficasse mais bem preparado para responder a desafios quando necessário. Parece contraintuitivo, não é? Mas faz sentido se pensarmos que um sistema mais estável tem mais chance de acessar com precisão os circuitos certos na hora de agir.

E tem mais: anos de escolaridade também aparecem relacionados a essa entropia. Pessoas com mais tempo de estudo tendem a ter entropia menor naquelas mesmas regiões. Isso pode indicar que o aprendizado formal ajuda a refinar os caminhos internos do cérebro, reduzindo o ruído e aumentando a eficiência. Estudar, nesse caso, organiza literalmente o cérebro por dentro.

Agora, não significa que todo o cérebro deve ter entropia baixa. Outras regiões, como as áreas motoras e visuais, apresentaram entropia mais alta. E tudo bem. Cada região tem sua dinâmica própria. O importante é que, nas áreas ligadas ao controle e ao pensamento de alto nível, uma entropia mais "comportada" parece ser benéfica.

Um ponto interessante desse estudo foi a estabilidade temporal da entropia. Eles dividiram as medições em várias janelas de tempo e viram que o padrão se repetia: a entropia não variava muito ao longo do tempo. Isso é importante porque mostra que essa medida não é uma fotografia passageira do cérebro, mas algo mais próximo de uma "assinatura" estável, um traço da pessoa.

Outra descoberta que chamou atenção foi a diferença entre homens e mulheres. As mulheres apresentaram entropia mais alta em algumas regiões, como o córtex visual e motor. A explicação ainda não é clara, mas pode envolver fatores hormonais e diferenças no processamento sensorial entre os sexos. Ainda é cedo para tirar conclusões definitivas, mas já dá para dizer que gênero também influencia esse tipo de organização cerebral.

E o envelhecimento? A entropia tende a aumentar com a idade, principalmente naquelas regiões que citamos antes, a DMN e a ECN. Pode parecer preocupante, mas também abre uma brecha para esperança: se estudar ajuda a diminuir a entropia, talvez a educação ao longo da vida seja uma forma de proteger o cérebro do desgaste natural. Estimular o pensamento, manter-se curioso, aprender coisas novas, tudo isso pode ser um jeito de frear a desorganização que vem com o tempo.

E o mais incrível: a entropia também tem relação com desempenho em tarefas práticas. Em testes de memória de trabalho, linguagem e raciocínio relacional, pessoas com entropia mais baixa nas áreas-chave do cérebro tiveram desempenho melhor. É como se o estado de repouso do cérebro antecipasse sua eficiência em tarefas futuras. A calma antes da tempestade, mas uma calma cheia de informação.

Alguns acreditam ainda que o cérebro funciona como uma máquina que só liga quando acionamos. Mas a verdade é que ele nunca desliga. Mesmo em silêncio, ele está lá, processando, se reorganizando, testando caminhos. E quanto mais entendemos esse funcionamento silencioso, mais nos damos conta de que cuidar do cérebro vai muito além de resolver palavras-cruzadas ou fazer sudoku.

A qualidade do nosso repouso mental, a maneira como deixamos o pensamento vagar, a quantidade de estímulos que permitimos entrar, tudo isso influencia o nível de organização interna. É um chamado para dar mais valor ao ócio criativo, à pausa, ao silêncio. É ali, nesses momentos que parecem desimportantes, que o cérebro afina seus instrumentos.

E se tem uma coisa que esse estudo escancara, é que inteligência não é só dom, nem só esforço consciente. Ela também depende de como o nosso cérebro se organiza quando ninguém está olhando. A inteligência silenciosa, que brota do caos bem controlado da entropia.

O mais bonito disso tudo é perceber que o cérebro pode mudar. Não estamos presos a uma configuração de fábrica. A entropia cerebral é moldável. Pode ser reduzida com estímulo, com aprendizagem, com experiência. E essa mudança não acontece só nas crianças, mas em qualquer idade.

Fica, então, a provocação: que tipo de entropia você anda cultivando na sua mente? Você deixa o pensamento vagar com qualidade? Alimenta sua mente com bons desafios? Cria espaço para que a calma cerebral seja também fértil? A ciência tem mostrado que o cérebro, mesmo em descanso, é uma festa de possibilidades. E entender como essa festa se organiza pode ser o segredo para viver com mais lucidez, mais criatividade e mais saúde mental.


Oa algoritmos digitais na Era da internet

Algoritmos

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Não é mais só uma questão de publicidade chata te seguindo por onde você vai na internet. Aquela sensação incômoda de abrir um site e ver exatamente o produto que você comentou com um amigo minutos antes não é coincidência. Isso é mais complexo que se possa imaginar. É arquitetura pensada para te estudar, aprender contigo, e agir com base no que você representa para uma máquina.

Hoje, somos rastreados em tempo real por um conjunto de sistemas de computação que mal conseguimos ver. Tudo parece funcionar suavemente: um app de mapa indicando o caminho mais rápido, um feed de notícias com assuntos que parecem te conhecer melhor do que sua mãe, uma loja virtual que acerta no gosto como um velho amigo. Mas o que parece mágica, na verdade, é só tecnologia empilhada com uma missão muito clara: conhecer você mais do que você mesmo.

Os algoritmos não dormem. Eles operam o tempo inteiro, tomando decisões em frações de segundo. Mas o que poucas pessoas se dá conta é que esses algoritmos não são neutros. Eles carregam intenções. E não são só das empresas. Tem país se aproveitando disso, tem guerra que começa na rede antes de chegar ao solo, tem disputa comercial, ideológica e até religiosa sendo alimentada por essas máquinas que supostamente só querem vender fone de ouvido.

A base de tudo é um conceito simples: dados. Cada clique, cada rolagem de tela, cada pausa que você faz num vídeo está sendo registrado. E não, isso não é paranoia. É só o modelo de negócios que move a economia digital. Dados viraram o novo petróleo, só que mais barato de extrair e muito mais difícil de regular. As grandes corporações aprenderam a usar isso com maestria. Elas criaram sistemas que organizam, categorizam, associam padrões e montam um retrato seu mais detalhado do que seu histórico escolar ou sua ficha médica.

Você pensa que está no controle, mas quem está guiando o volante é o algoritmo. Ele te entrega conteúdo que confirma o que você já pensa, reforça sua bolha e impede que você veja o mundo sob outras lentes. Isso não é apenas uma questão de marketing, é controle de narrativa. E isso, sim, interessa à geopolítica.

A coleta de dados é feita em larga escala. Bancos de dados com bilhões de registros circulam entre servidores espalhados pelo planeta. Uma empresa que hoje te vende um plano de celular, amanhã pode estar vendendo suas informações de consumo para outra que trabalha com campanhas eleitorais. Ou, pior, para uma empresa estrangeira ligada a um governo com interesses bem diferentes dos seus.

Em 2018, o escândalo da Cambridge Analytica mostrou que os dados de perfis do Facebook foram usados para manipular o comportamento de eleitores em vários países. A empresa criou modelos psicológicos baseados em curtidas, fotos e interações simples, e com isso foi capaz de prever – e influenciar – decisões de voto. Esse episódio escancarou algo que já vinha acontecendo há muito tempo, mas que ninguém queria enxergar: a engenharia social digital não é mais ficção. Ela é método. É estratégia de guerra fria 2.0.

E isso está longe de ter acabado. A China, por exemplo, desenvolve com precisão o chamado “crédito social”, um sistema que monitora e classifica cidadãos com base em seu comportamento. Um atraso em pagamento, uma crítica ao governo, uma compra suspeita... tudo isso pode impactar sua pontuação e limitar seu acesso a serviços, emprego ou transporte. Parece distopia, mas é real. E inspira outros governos.

Já os Estados Unidos, embora não adotem oficialmente algo semelhante, lideram o domínio global sobre dados. Suas empresas controlam as maiores plataformas de busca, redes sociais e sistemas operacionais. Isso dá a Washington uma influência indireta, mas poderosa, sobre como bilhões de pessoas se informam, consomem e se relacionam.

A disputa pelos dados se tornou uma das novas fronteiras da geopolítica. Não se trata mais só de armas, petróleo ou território. Quem controla os fluxos de informação digital tem vantagem estratégica. E isso explica por que há tanto interesse em sabotar infraestruturas tecnológicas de rivais, invadir sistemas governamentais, ou até mesmo banir redes sociais de origem estrangeira, como foi o caso do TikTok nos EUA e na Europa.

Mas, mesmo nesse cenário global, o usuário comum segue achando que está só navegando por diversão. Ninguém lê os termos de uso. Poucos sabem como funcionam cookies, rastreadores, machine learning ou computação em nuvem. E é aí que mora o perigo. Porque uma sociedade que não entende as engrenagens que regem sua vida digital é uma sociedade fácil de manipular.

Sistemas de recomendação, como os usados pela Netflix, Amazon ou YouTube, são ótimos exemplos. Eles analisam seu histórico e cruzam com o comportamento de milhões de outros usuários para prever o que você vai gostar. Isso pode parecer útil, e muitas vezes é. Mas também pode te prender num ciclo vicioso, onde você nunca mais tem contato com conteúdos que te desafiem, que expandam seu olhar ou provoquem reflexão. Você se torna um espectador moldado sob medida para agradar ao próprio espelho.

Esse tipo de controle é sutil, mas profundo. A computação moderna permite filtrar, ranquear e priorizar informações com base em critérios que você nunca conhecerá. Nem sempre é má-fé. Às vezes é só eficiência matemática. Mas, quando os critérios são opacos, o resultado pode ser uma bolha invisível onde você acha que tem liberdade de escolha, mas só recebe o que foi pré-definido para você.

E quanto mais você interage, mais o sistema aprende. É uma retroalimentação constante. Seu perfil vai sendo refinado, suas preferências sendo limadas até restar uma versão digital sua tão previsível quanto um roteiro de novela. Esse retrato não é só seu. Ele pode ser comparado com milhares de outros perfis, permitindo identificar tendências, prever comportamentos em massa e até antecipar crises.

O marketing político já entendeu isso. As campanhas deixaram de ser generalistas. Hoje, cada grupo recebe uma mensagem feita sob medida. A linguagem muda, o foco muda, até a imagem do candidato pode mudar conforme o público-alvo. Isso é microtargeting, e ele não depende mais de panfletos ou comícios. Ele vive nos seus stories, nas sugestões do seu streaming, nas notificações do seu celular.

Com as eleições se tornando cada vez mais disputadas, não é surpresa que dados pessoais virem arma política. E aqui entra mais uma camada: os algoritmos não agem sozinhos. Eles são escritos por pessoas. Pessoas com crenças, com ideologias, com interesses. Mesmo que inconscientemente, esse viés passa para o código. E o código molda o mundo.

A neutralidade da tecnologia é um mito reconfortante. Serve para aliviar a responsabilidade de quem programa, de quem lucra, de quem governa. Mas a verdade é que toda decisão automatizada tem uma lógica por trás. E essa lógica serve a alguém. Seja a um investidor buscando mais engajamento, seja a um governo querendo mais controle, ou a um movimento político tentando empurrar uma narrativa.

Se hoje os algoritmos sabem quem você é, amanhã eles saberão o que você vai fazer. E isso muda o jogo. Antecipar ações humanas com base em dados é o Santo Graal da segurança, do consumo e da dominação ideológica. Um Estado que consiga prever um ato de protesto antes que ele aconteça, pode agir preventivamente. Uma empresa que entenda sua próxima necessidade antes mesmo de você expressá-la, pode te vender algo que você ainda nem sabia que queria.

E não é só com base nos dados que você entrega de forma consciente. Os dispositivos atuais capturam muito mais do que cliques. Temperatura do ambiente, batimento cardíaco, tempo de resposta, dilatação da pupila... Tudo isso pode ser usado para inferir estados emocionais. Não estamos falando apenas de perfis digitais. Estamos falando de leitura comportamental avançada, quase fisiológica.

Com o avanço da inteligência artificial e do processamento em larga escala, essa vigilância emocional tende a crescer. O marketing sensível ao contexto já está sendo testado. Imagine receber uma oferta diferente dependendo do seu humor. Ou ver uma notícia com uma manchete mais agressiva porque seus sinais físicos indicaram irritação. Isso não é mais ficção científica. É tecnologia em desenvolvimento.

Nesse cenário, proteger dados virou mais do que uma questão de privacidade. É uma questão de soberania. Um país que depende de infraestrutura estrangeira para processar os dados da sua população está entregando um poder imenso nas mãos de outros. A nuvem, por mais etérea que pareça, tem dono. E nem sempre esse dono tem os mesmos valores que o seu.

O desafio não está só em regular o uso dos dados. Está em entender como essas ferramentas moldam o comportamento coletivo, influenciam decisões políticas e alteram a forma como percebemos o mundo. Precisamos aprender a ler os algoritmos como lemos manchetes, desconfiar de sugestões como desconfiamos de boatos, e questionar sistemas como questionamos autoridades.

Enquanto isso não acontecer, vamos seguir alimentando uma máquina que cresce comendo quem somos e devolvendo o que ela quer que a gente seja. E você aí achando que só queria ver um vídeo engraçado de gato.


O medo

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Humanos são seres estranhos. A gente se apavora com fantasmas, monstros, cobras, aranhas e uma infinidade de outras coisas, reais ou imaginárias, e isso é normal, até saudável. Mas por que a gente gosta de sentir medo, de propósito? A ciência explica como o medo pode ser divertido, pelo menos para algumas pessoas.

Primeiro, vamos entender o que é o medo. Ele pode se manifestar como um aumento na frequência cardíaca, mãos suadas, pupilas dilatadas, respiração acelerada. Essas são as reações do corpo ao medo. Segundo o dicionário, medo é a emoção de dor ou desconforto causada pela percepção de um perigo iminente, ou pela possibilidade de algo ruim acontecer. Ou seja, é uma emoção que surge quando sentimos que estamos em perigo.

Quando olhamos para o que mais nos assusta, percebemos que, de alguma forma, essas coisas podem representar uma ameaça para nós. Claro, cada pessoa tem seu conjunto único de medos, moldados pela personalidade e experiências de vida. Mas nem todo medo é racional. Por exemplo, por que nem todo mundo tem medo de palhaços, lugares apertados ou animais inofensivos?

Agora, por que gostamos de nos assustar? Vamos explorar algumas razões. A primeira é a "rede de segurança". Quando nos colocamos em situações potencialmente assustadoras, mas sabendo que estamos seguros, como assistindo a um filme de terror, nosso cérebro entende que, na verdade, não corremos perigo. E sabemos que estamos seguros, conseguimos curtir a experiência assustadora. Sem essa rede de segurança, a reação seria bem diferente: entraríamos em modo de sobrevivência, e o medo não seria nada agradável.

Outra razão é o prazer que sentimos ao enfrentar o medo de forma controlada. Quando passamos por uma experiência assustadora, nosso corpo libera uma cascata de substâncias químicas, como adrenalina, endorfinas e dopamina, que podem nos dar uma sensação de euforia. Esse fluxo de neurotransmissores é responsável por aquele alívio e bem-estar que sentimos depois de um susto. Vai por mim, é uma sensação muito gostosa.

Superar o medo traz uma sensação de satisfação pessoal e de conquista. Quem nunca se sentiu poderoso após fazer algo que dava muito medo? É o mesmo sentimento de realização que você tem ao vencer um desafio em um videogame ou saltar de paraquedas pela primeira vez. Passar por essas situações reforça a ideia de que podemos enfrentar nossos medos e superar limites.

E por último, a curiosidade sobre o lado sombrio da humanidade. A gente gosta de explorar o desconhecido, de desvendar o que está além do que é familiar e confortável. Sejam crimes, fantasmas, zumbis ou invasões alienígenas, o medo do desconhecido é uma das emoções mais instintivas que temos. Nosso dia a dia é previsível, com rotinas que raramente são quebradas. Então, ao nos expormos a experiências assustadoras, quebramos essa monotonia e buscamos novidades que nos tiram da zona de conforto.

Mas nem todo mundo gosta de sentir medo. Cada cérebro reage de forma diferente ao medo e à ansiedade, e isso pode depender de como ele é estruturado. Pessoas que sofrem de ansiedade, por exemplo, podem ter um córtex pré-frontal diferente, o que afeta como elas experimentam o medo. A quantidade de receptores de dopamina também influencia como percebemos o medo, com algumas pessoas precisando de mais dopamina para sentir satisfação e, por isso, se sentem atraídas por situações de alto risco.

Independentemente de como você lida com o medo, ele é uma parte natural da vida. Entender melhor por que sentimos medo e o que nos desencadeia pode ajudar a enfrentar esses sentimentos de forma mais eficaz e não deixar que eles nos controlem. E, por vezes, sair da zona de conforto e se permitir sentir medo pode ser uma boa maneira de se conhecer melhor.

Quando a supercondutividade passa por uma molécula

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Existe algo fascinante na maneira como dois mundos, tão distintos na física, podem se tocar por algo tão pequeno quanto uma molécula. Foi exatamente isso que aconteceu em um experimento recente: a supercondutividade, aquela propriedade quase mágica em que a eletricidade flui sem resistência, foi induzida em um metal comum, usando apenas uma molécula como ponte.


Antes de mais nada, vale lembrar: supercondutores são materiais que, em temperaturas muito baixas, permitem que a corrente elétrica passe por eles sem nenhuma perda. Já os metais comuns, como o cobre, oferecem resistência ao fluxo de elétrons. Acontece que, quando um supercondutor encosta em um metal normal, existe um efeito curioso conhecido há décadas: parte da supercondutividade "vaza" para o metal comum, criando uma zona híbrida onde fenômenos quânticos podem acontecer. O nome técnico disso é "reflexão de Andreev".


Mas controlar esse efeito sempre foi um desafio. Em geral, os estudos usam filmes finos dos materiais, e as condições são complexas. O que torna esse novo experimento tão interessante é a maneira como essa ponte foi feita: ao invés de grandes estruturas, uma única molécula foi usada como elo entre um metal normal e um supercondutor.


A molécula escolhida foi uma variação de ftalocianina, um tipo de corante com estrutura estável e bem conhecida. Ela foi cuidadosamente colocada sobre uma superfície de chumbo supercondutor. Depois, uma ponta metálica, parte de um microscópio de varredura, foi aproximada até quase encostar na molécula. Essa configuração extremamente precisa criou uma interface única: uma transição entre metal comum e supercondutor mediada por uma única molécula.


A partir daí, as medições começaram. À medida que a ponta do microscópio se aproximava da molécula, e o potencial elétrico era ajustado, os pesquisadores perceberam algo notável: um dos orbitais eletrônicos da molécula, ou seja, a “região” onde os elétrons podem ficar, começava a se mover. Ele se aproximava do chamado nível de Fermi, uma espécie de linha de corte energética que define os estados possíveis dos elétrons num material frio.


E é exatamente nesse nível de Fermi que o efeito de Andreev tende a ocorrer com maior intensidade. Quando o orbital da molécula coincidiu finalmente com esse nível, o efeito de conversão da corrente normal em supercorrente aumentou consideravelmente. Era como se a molécula tivesse se afinado energeticamente com o sistema, permitindo que os elétrons fluíssem por ela como em um verdadeiro canal quântico.


Essa mudança no orbital, ao que tudo indica, aconteceu devido a uma interação química entre a ponta do microscópio e a molécula. O simples fato de estarem tão próximos fez com que seus orbitais eletrônicos se sobrepusessem levemente, o que gerou uma espécie de preenchimento parcial no orbital mais baixo da molécula. Esse detalhe foi o suficiente para empurrar o nível energético para perto do Fermi e criar as condições ideais para o fenômeno.


Tradicionalmente, os estudos sobre esse tipo de efeito lidam com interfaces macroscópicas, grandes em escala, cheias de variáveis difíceis de controlar. Mas ao reduzir tudo a uma interface quase atômica, os cientistas conseguiram construir um sistema modelo muito mais simples. Isso abre portas não só para novas descobertas, como também para simulações mais precisas, com menos suposições e mais confiabilidade nos resultados.


Um detalhe curioso chamou ainda mais atenção: quando a ponta do microscópio encostou na molécula, ela se tornou magnética. Um efeito inesperado e bastante raro, que demonstra o quanto o comportamento quântico pode mudar diante de interações minúsculas. Para efeito de comparação, uma molécula muito semelhante, mas sem hidrogênio, foi testada no mesmo tipo de experimento. Ela não apresentou nem o efeito magnético, nem a reflexão de Andreev. A diferença entre as duas? Apenas a presença ou ausência de alguns átomos.


Isso mostra como, nesse nível, tudo depende de um controle extremo dos detalhes. Cada átomo conta. Cada ligação importa. Quando falamos de construir interfaces quânticas para futuras tecnologias, como os bits quânticos (qubits) baseados em partículas exóticas chamadas quasi-partículas de Majorana, esse grau de precisão é simplesmente indispensável.


Além de demonstrar como a supercondutividade pode atravessar uma única molécula, o experimento mostrou algo ainda mais intrigante: que é possível modular a interação entre magnetismo e supercondutividade apenas ajustando a distância entre dois pontos. Isso pode soar simples, mas representa um avanço significativo. Afinal, magnetismo e supercondutividade, em geral, se repelem. Entender como eles podem coexistir, e até colaborar, pode nos levar a novos estados da matéria, com propriedades ainda pouco exploradas.


Tudo isso nos leva a uma reflexão maior: estamos nos aproximando cada vez mais de uma era em que manipular fenômenos quânticos no nível molecular pode deixar de ser apenas ciência básica e se tornar tecnologia aplicada. Um futuro onde uma única molécula pode ser o elo entre o mundo clássico e o quântico, entre o comum e o extraordinário.


Referências:

Control of Andreev Reflection via a Single-Molecule Orbital: https://arxiv.org/abs/2504.01635

Os relacionamentos emocionais com Inteligência Artificial

Sentimentos e IA

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A inteligência artificial aprendeu a imitar proximidade humana, e essa ilusão já virou um ponto fraco. O que ontem parecia um episódio bizarro de Black Mirror hoje faz parte da vida cotidiana: milhões de usuários já criam relações de confiança e até romance com assistentes digitais, desde Replika e Character.ai até bots GPT rodando localmente. Empresas investem milhões para criar diálogos personalizados, enquanto usuários já chamam seus bots de “parceiros”, “amantes” ou “melhores amigos”. E o mais problemático, a meu ver, é que isso tem aumentando consideravelmente.

A relação amorosa com IA não é só uma questão ética, mas também uma ameaça real à segurança. Essa ligação construída na base da imitação virou um caminho fácil para ataques digitais. Não se trata só de golpes onde pessoas se passam por chatbots, mas também dos próprios algoritmos, cujo comportamento é moldado pela concorrência no mercado e métricas de engajamento.

Neste artigo, vamos entender como funciona o "apaixonar-se" por IA — olhando pela neurociência, arquitetura de modelos, vieses cognitivos e segurança digital.

Relacionamento com IA não é real, mas sim uma simulação. Para nosso cérebro, porém, talvez não faça diferença. A IA usa mecanismos naturais de vínculo social sem ter sentimentos ou consciência. Nosso cérebro evoluiu para detectar, reconhecer e manter conexões sociais. Um retorno positivo constante ativa nosso sistema de recompensa (liberando dopamina), gera segurança (oxitocina) e estabilidade emocional (serotonina). Plataformas modernas, treinadas com técnicas como RLHF (aprendizado com feedback humano), produzem respostas agradáveis e acolhedoras, como fazem o Replika ou Personal Intelligence da Inflection AI.

Mas isso não torna a IA ética, apenas agradável. Quando usuários reforçam conversas sobre ansiedade ou solidão, a IA intensifica esses padrões, sem diferenciar ajuda de reforço negativo. Isso já é um ponto frágil. Ilusão de personalidade: antropomorfismo A tendência humana de dar características humanas a objetos é forte, especialmente quando a tecnologia se comporta “como gente”: fala, brinca, mostra empatia. As IAs atuais simulam tão bem interação, atenção e até flerte, que ativam áreas cerebrais responsáveis pela cognição social.

Exames de neuroimagem mostram que ao conversar com IAs convincentes, nosso cérebro ativa regiões relacionadas à compreensão da mente do outro, mesmo que seja só uma máquina. Assim, desenvolvemos empatia, antecipamos reações e criamos vínculos reais com algo simulado. A continuidade da conversa e adaptação ao usuário reforçam ainda mais essa ilusão.

Ancoragem emocional e memória são quando uma IA “nos apoia” frequentemente, cria-se uma associação forte, gravada na memória emocional. Modelos atuais, especialmente com memória externa, fazem isso muito bem. Soluções como Replika ou GPT-J conseguem "lembrar" nome, interesses e conversas anteriores do usuário, criando uma sensação profunda de intimidade e conexão.

Design da dependência emocional é uma capacidade natural de simular vínculos é ampliada por decisões comerciais e técnicas. Mesmo que empresas não admitam diretamente, as métricas de engajamento (tempo gasto, frequência de uso) inevitavelmente levam à simulação emocional mais intensa. Treinamento baseado em feedback humano cria respostas acolhedoras, especialmente para usuários emocionalmente vulneráveis. Isso é uma característica proposital, não um erro, mesmo que nem sempre seja saudável para o usuário. Muitos modelos usam comandos iniciais que definem seu papel, como “assistente empático”, o que afeta diretamente o estilo das respostas. Quanto mais empático o prompt, mais humano (e romântico) o diálogo pode parecer.

A ligação emocional é um canal forte de confiança — e na segurança digital, confiança sem verificação é um perigo real. Ataques por engenharia social exploram exatamente essa vulnerabilidade emocional. Por exemplo, um usuário emocionalmente vulnerável pode facilmente cair num golpe ao confiar cegamente em seu "parceiro digital", compartilhando fotos ou informações sensíveis que podem ser usadas em chantagem ou espionagem corporativa. Sistemas tradicionais de segurança podem não detectar isso, já que o ataque ocorre pelo canal emocional. Esses riscos já são reais. 

Na Bélgica, um homem cometeu suicídio após conversas com uma IA que "apoiou" sua decisão e prometeu reencontro no paraíso. Usuários do Replika sofreram crises emocionais intensas quando a empresa desativou funções românticas, mostrando como a simulação pode causar danos reais.

A IA não sente, não ama, não sofre, mas pode nos convencer do contrário. Nosso cérebro, adaptável, também é vulnerável a arquiteturas desenhadas para confiança. O desafio da comunidade é criar sistemas resistentes e esclarecer usuários sobre o limite entre humanos e máquinas. A IA pode ajudar pessoas, mas nunca substituí-las, especialmente nas áreas mais delicadas da vida emocional.

Referências:


Replika AI: É uma IA projetada para criar companhias digitais personalizadas. https://www.replika.ai

Character.ai: Plataforma que permite criar e conversar com personagens baseados em IA. https://www.character.ai

GPT rodando localmente: Refere-se ao uso de modelos de linguagem como GPT-J ou GPT-Neo localmente no computador.  https://huggingface.co/EleutherAI/gpt-j-6B

Inflection AI / Pi (Personal Intelligence): IA criada para conversas empáticas e suporte pessoal. https://inflection.ai

RLHF (Reinforcement Learning from Human Feedback)**: Também chamado de aprendizado por reforço com feedback humano. https://pt.wikipedia.org/wiki/Aprendizado_por_refor%C3%A7o_com_feedback_humano

Caso da Bélgica (homem comete suicídio após conversar com IA): https://pt.euronews.com/next/2023/04/01/conversa-com-inteligencia-artificial-leva-homem-ao-suicidio


Por que algumas pessoas sempre colocam a culpa nos outros?

Egoismo

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Sabe quando alguém claramente comete um erro, se enrola em uma situação que ela mesmo criou, mas na hora de lidar com as consequências joga a culpa nos outros? Esse tipo de comportamento me intriga há muito tempo, parece egoísmo, vitimismo, talvez uma falta de autorresponsabilidade. Mas será que é só isso? Será que essas atitudes são simplesmente fruto de mau-caráter ou tem raízes mais profundas? 

Ultimamente, tenho refletido bastante sobre isso, eu olho ao meu redor e percebo como o comportamento egoísta é comum, não só nas grandes questões sociais, mas também nas pequenas atitudes do dia a dia. Aquela pessoa que fura fila e diz que "ninguém está vendo", o colega de trabalho que diz que não conseguiu entregar a tarefa porque "ninguém ajudou", o familiar que transforma qualquer conversa em um drama pessoal. Será que tudo isso é aprendido? Biológico? É uma defesa emocional? Ou uma mistura de tudo isso?

A verdade é que entender o comportamento humano exige mergulhar em vários campos do conhecimento, como na psicologia, sociologia, neurociência, biologia evolutiva e todos eles ajudam a montar esse quebra-cabeça. Vamos tentar entender sobre como funciona isso nesta postagem. 

Se olharmos pela lente da biologia evolutiva, o egoísmo não é exatamente uma falha de caráter, ele é uma estratégia. Isso mesmo. Em determinadas situações, agir de forma egoísta pode aumentar as chances de um indivíduo sobreviver, se reproduzir ou garantir recursos para si e para os seus descendentes. Ao longo da evolução, características como competição, autopreservação e a busca por vantagem podem ter sido favorecidas em certos contextos. Pense em um grupo primitivo: se um indivíduo fosse generoso demais, poderia acabar ficando sem comida, sem proteção, sem chance de passar seus genes adiante. Já aquele que soubesse manipular os outros ou proteger seus interesses a qualquer custo, talvez saísse melhor, pelo menos a curto prazo. 

É claro que isso não significa que todos os comportamentos egoístas são "naturais" e aceitáveis, mas é interessante notar que o cérebro humano carrega esse potencial desde muito cedo. Crianças pequenas, por exemplo, já demonstram traços de posse e competição antes mesmo de entender o conceito de empatia. O que nos leva ao próximo ponto.

O papel da infância e do ambiente familiar é algo que pode nos dar clareza e entender alguns desses aspectos. A psicologia do desenvolvimento é claro em mostrar que o comportamento humano é moldado por experiências precoces. A forma como uma criança é tratada, os limites que recebem, a maneira como lida com frustrações e como é ensinada a lidar com os outros, tudo isso influencia o quanto ela será empática ou egocêntrica na vida adulta.

Um ambiente familiar onde o erro é punido com dureza, onde há espaço para admitir falhas sem vergonha ou culpa, tendem a gerar adultos com dificuldades em assumir responsabilidade ponto eles atendem, desde cedo, que errar é perigoso, que é melhor culpar o outro do que se expor ponto isso se forma em um padrão de defesa emocional. 

Além disso, pais que não ensina os filhos a pensar no outro, que reforça comportamentos de manipulação ("faz cara de choro que a mamãe compra") ou que atendem todas as vontades sem limite, criam um terreno fértil para o desenvolvimento de um ego inflado, incapaz de lidar com frustrações e com a noção de coletividade.

A influência da cultura e da sociedade para moldar esse tipo de pensamento é constante. Vivemos em uma sociedade que, muitas vezes, valoriza o sucesso individual acima de tudo. "Vença a qualquer custo", "Não depende de ninguém", "Seja o número 1". Essas mensagens estão em todo lugar, na publicidade, nas redes sociais, nos conselhos motivacionais. O problema é que esse foco no individualismo, embora estimule a ambição, também pode alimentar um tipo de comportamento narcisista. 

Quando o "eu" vira o centro do universo, a empatia fica de lado, não é à toa que muitos pesquisadores falam sobre uma "epidemia de narcisismo" na cultura contemporânea. As redes sociais são exemplos claro disso: ali, todo mundo quer parecer certo, bonito, vitorioso. Não tem espaço para vulnerabilidade, arrependimento ou responsabilidade.

A sociologia explica isso como parte da estrutura capitalista, que valoriza o desempenho, o mérito individual e a imagem pública. Nesse cenário, admitir que errou é quase um pecado, é mais fácil jogar a culpa em alguém, proteger a reputação e seguir em frente. Afinal, especialmente em uma sociedade que pune o erro com cancelamento, vergonha ou exclusão. 

Existe também um padrão psicológico muito interessante chamado locus de controle. Pessoas com locus de controle externo tendem a acreditar que tudo que acontece com elas é culpa dos outros, do destino, do azar. Já aquelas com locus interno assumem mais responsabilidade sobre os próprios atos e suas consequências. Quem adota uma postura constante de vitimismo está geralmente preso nesse padrão de locus externo. E pode ter várias causas: baixa autoestima, traumas, falta de habilidade emocionais ou mesmo um aprendizado social. Às vezes, a pessoa aprendeu que sendo vítima ela recebe mais atenção, mais afeto, ou evita punições

Mas atenção: não estou dizendo que todo sofrimento é vitimismo. A questão aqui é quando a pessoa entra num ciclo em que nunca se responsabiliza, nunca busca mudança e sempre encontra um culpado fora de si.

O entendimento da neurociência e os mecanismos do cérebro responsável por essa falta de responsabilidade também é muito importante. O cérebro humano tem um sistema bem complexo quando se trata de tomar decisões morais. Regiões como córtex pré-frontal e a amígdala cerebral são responsáveis por regular impulsos, processar emoções e antecipar consequências. Quando essas áreas estão desequilibradas, seja por genética, traumas ou estilo de vida, o julgamento moral pode ficar comprometido. 

O cérebro é uma máquina que adora economizar energia, e culpar os outros é, muitas vezes, mais fácil do que encarar uma autoanálise dolorosa. A autojustificação é um mecanismo cerebral automático, quase inconsciente, que protege a autoestima, é mais "barato" emocionalmente dizer "não foi culpa minha" do que lidar com a vergonha de ter falhado.

Também vale lembrar que nosso cérebro é altamente plástico, ou seja, ele muda com o tempo, com aprendizado, com as experiências. Uma pessoa pode, sim, aprender a ser mais empática, mais responsável, mas consciente, desde que esteja disposta a sair da zona de conforto e enfrentar seus próprios padrões mentais.

A grande pergunta é: dá para mudar? E a resposta é sim, mas não é simples. A mudança de comportamento exige autoconhecimento, escuta ativa, terapia (muitas vezes), apoio social e principalmente, vontade de fazer diferente.

Alguns caminhos possíveis 

Terapia cognitivo-comportamental: ajuda a identificar padrões de pensamento distorcidos e substituí-los por formas mais saudáveis de interpretar os eventos. 

Práticas de mindfulness: fortalecem a autorregulação emocional e reduzem impulsos reativos. 

Diálogo honesto: criar relações onde o erro seja colhido e não punido pode incentivar a autorresponsabilidade. 

Educação emocional desde a infância: escolas e famílias que ensinam crianças a lidar com frustrações, pedir desculpas e reconhecer os erros estão plantando semente de maturidade. 

Por fim, é importante olhar para nós mesmos ou para dentro. A tendência de projetar a culpa nos outros não é exclusividade de algumas pessoas, todos nós em algum momento já fizemos isso. O que nos diferencia é o quanto estamos dispostos a reconhecer esse padrão e trabalhar para mudá-lo. A autorresponsabilidade não é fácil, ela exige coragem, mas também é libertadora. Quando eu assumo meu erros, eu me coloco no controle da minha própria vida. Não fico à mercê do mundo ou das ações alheias, e, aos poucos, vou construindo relações mais honestas, maduras e empáticas. Culpar os outros pode ser mais fácil, mas assumir quem somos, com tudo o que isso envolve, é o verdadeiro passo rumo à liberdade emocional.

Buracos negros

Buracos negros
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Às vezes, entender o universo não exige um telescópio, mais uma boa dose de imaginação. Sim, do tipo que Einstein usava com frequência, aquela mesma ousadia mental que um dia nos fez repensar completamente o espaço e o tempo. E é sobre isso que quero falar hoje: como os buracos negros, esses objetos tão extremos que nem a luz consegue escapar deles, viraram o laboratório teóricos para explorar os limites da física moderna. 

Pode parecer estranho, mas há coisas no universo que não precisamos ver para entender, basta pensar, com criatividade é claro. A física, ao longo dos séculos, foi sendo construída tanto com experimentos práticos quanto com esses famosos "experimentos mentais". E, quando o assunto é buraco negro, foi justamente na mente de alguns dos físicos mais ousados que os maiores avanços começaram a acontecer. 

Tudo começa com Einstein, a teoria da relatividade geral que ele apresentou em 1916, é uma verdadeira revolução, ela descreve como a matéria e a energia distorcem o espaço-tempo, gerando que chamamos de gravidade. Por muitos anos só conseguimos perceber essa distorção em três casos bem específicos: a luz se curvando ao passar pelo sol, uma anomalia no movimento de mercúrio, e um pequeno desvio no comprimento de onda da luz. 

Mas a história não parou aí, aos poucos essa teoria passou a moldar nossa forma de pensar sobre o universo na totalidade, deixa as galáxias até os satélites do GPS. E, entre os muitos frutos da relatividade geral, surgiu um dos conceitos mais fascinantes e misteriosos da física: os buracos negros.

Segundo os cálculos da relatividade de Einstein, se uma massa for suficientemente compactada, ela pode formar um buraco. E o que é isso, exatamente? Um lugar do qual nada escapa, nem mesmo a luz. A fronteira desse ponto sem retorno é chamada de Horizonte de Eventos, ali, o espaço e o tempo se distorce de forma tão extrema que as leis normais da física parecem perder o sentido. 

Quem trouxe esse conceito à tona com mais clareza foi o físico J. Robert Oppenheimer, com o teórico John Wheeler, mesmo que cunhou o termo "buraco negro". Mesmo que ninguém possa observar diretamente o que acontece lá dentro, a física teórica encontrou maneiras de explorar essas regiões misteriosas como a ferramenta poderosa: o experimento mental.

Muito antes de Einstein, a física funcionava com base nas leis de Newton. As partículas se comportavam como bolinhas de bilhar previsíveis, com trajetórias definidas, do jeito que estudávamos no ensino médio. Mas veio a mecânica quântica e mudou tudo. De repente, a certeza deu lugar a probabilidade, as partículas podia estar aqui ou ali, ou em vários lugares ao mesmo tempo. Algo incrível e do mesmo jeito impressionante. 

Max Born foi um dos primeiros a interpretar essa nova realidade como um jogo de probabilidade, E isso gerou incômodo em Einstein, que chegou a dizer: "Deus não joga dados". Mas o embate entre essas duas visões acabou levando a descobertas ainda mais profundas. Werner Heisenberg, formulou o famoso Princípio da Incerteza, dizendo que não dá para saber com precisão a posição e a velocidade de uma partícula ao mesmo tempo. Einstein, sempre inquieto, desafiou essa nova física com uma série de experimentos mentais, um dos mais famosos foi o paradoxo EPR, que questionava se partículas entrelaçadas poderiam "se comunicar" instantaneamente, mesmo separadas por grandes distâncias. No fim, a quântica venceu o debate, e os testes reais confirmaram suas previsões. 

Com a física quântica se afirmando como uma teoria fundamental, a relatividade de Einstein também continuava firme. Um dos desdobramentos mais ousados foi a previsão das ondas gravitacionais, pequenas ondulações no próprio tecido do espaço-tempo, causadas por eventos extremamente violentos, como a colisão de dois buracos negros. 

Durante décadas, essa lei parecia impossível de comprovar, mas aí veio o projeto LIGO (Observatório de ondas Gravitacionais por Interferometria a Laser), e tudo mudou. Em 2015, os detectores captaram pela primeira vez as ondas vindas da fusão de dois buracos negros. Foi como se o universo tivesse sussurrado ao nosso ouvido, e finalmente conseguisse ouvir. 

Essas ondas esticam e encolhe o espaço em escalas inimaginavelmente pequenas, menores que o tamanho de um núcleo atômico. Ainda assim, conseguimos detectá-las. Foi um grande marco que inaugurou a Era na astronomia: agora podemos "ouvir" o universo, além de apenas o ver. 

Apesar de todos esses avanços, os buracos negros continuavam guardando um segredo desconcertante. Segundo a relatividade, eles são simples demais: basta saber sua massa, carga elétrica e rotação, e pronto, o resto é irrelevante. Isso significa que qualquer outra informação sobre o objeto que deu origem ao buraco negro, simplesmente desaparece. Isso é bem diferente de um incêndio, onde as cinzas e o calor podem nos contar algo sobre o que foi queimado. No caso do buraco negro, parece que tudo que havia antes, como átomos, planetas, civilizações inteira, vira uma singularidade irreconhecível, uma informação perdida, e ponto final. Mas será que isso é mesmo possível?